Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil |
Reportagem publicada originalmente no Jornal Metropole em 29 de setembro de 2022
Um professor de matemática flagrado com uma arma no colégio onde leciona; um pai que matou o filho e a ex-mulher na frente de uma escola; uma criança de 3 anos que atirou acidentalmente na cabeça do irmão gêmeo. O que esses e tantos outros casos têm em comum? Armas. Pistola, revólver e carabina registradas no nome de pessoas com licença para Caçador, Atirador ou Colecionador de armas, os chamados CAC’s.
Até julho deste ano, circulavam pelo país mais de 1 milhão de armas registradas nas mãos de CAC’s. O número é quase o triplo das 290 mil unidades de 2017. Na 6ª Região Militar, formada pelos estados da Bahia e Sergipe, foram mais de 22 mil novas unidades inscritas nos últimos cinco anos e meio. É como se diariamente 11 armas fossem registradas no estado. Os dados são do Exército e foram obtidos pelos institutos Igarapé e Sou da Paz.
Foi uma dessas armas que, em junho, o professor Esdras Bandeira da Silva levou para a escola onde leciona, em Suzano (SP). Ele jogava vôlei com os alunos, quando o revólver caiu no chão da quadra. Por sorte,
a arma não disparou. A mesma sorte, no entanto, não teve uma criança de 3 anos de Macapá (AP). Na última sexta-feira, ela foi baleada acidentalmente pelo irmão gêmeo que manuseava a arma do pai, um atirador. A criança está internada na UTI e o pai foi liberado após prestar depoimento. Ele contou que havia retirado o objeto do cofre no dia anterior, para ir a um clube de tiro.
Uma terceira arma foi utilizada para matar Michelle Nicolich e seu filho de 2 anos em São Paulo, no início do mês. O
responsável pelos disparos foi Ezequiel Lemos Ramos, pai da criança. Ele tinha licença como CAC e contou à polícia que premeditou a ação porque a mulher teria lhe aplicado um golpe de R$ 70 mil. Ezequiel foi preso em flagrante.
Esses e tantos outros casos são resultado de uma política cujo objetivo é facilitar o acesso a armas. Desde que assumiu o Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro já editou mais de 40 decretos, que acabaram não só amenizando as exigências para porte e aumentando a quantidade de armas que um cidadão pode ter, como também dificultando o rastreio de balas e até liberando o comércio que antes era restrito às forças de segurança pública. Quem sai ganhando é a indústria armamentista. A fabricante Taurus, por exemplo, teve R$ 1,3 bilhão de lucro em 2021, um aumento de 323% quando comparado ao montante de 2018.
Professor de Estratégia e Gestão Pública, Sandro Cabral afirma que ainda não é possível correlacionar a escalada da violência à facilidade de acesso às armas, mas para ele é óbvio: “uma pistola que existe tem muito mais chance de matar alguém do que uma pistola que não existe”.
O que o professor chama atenção é para um outro beneficiário dessa facilidade de acesso às armas: o crime organizado. Sobral cita como exemplo um estudo realizado no Espírito Santo, pelo instituto Sou da Paz. O levantamento mostrou que 30% das armas com número de série usadas em crimes vieram do mercado legal. São armamentos que podem ter vindo de CAC’s e, de forma proposital ou não, foram parar nas mãos de criminosos.
Fonte: Metro 1
Tags
Bahia